quinta-feira, 3 de julho de 2008

A Paralização da Camionagem

Deixo de parte a análise da fragilidade do País e do estado perante paralizações, especialmente se levadas a cabo por empresários, em sectores vitais para o funcionamento da sociedade.
Determe-mei sómente num ponto.
Muitos fazedores de opinião (opiniom makers), analistas, políticos e politólogos, aproveitaram a paralização para, a toda a brida, calvalgarem o cavalo dos modelos de transporte não dependentes do petróleo.
A solução mais "balada" para evitar situações de rotura de abastecimentos era a da expansão da utilização dos caminhos de ferro.
O que todas essas mentes não explicaram é a forma e o modo como conduziriam, de um lado, as mercadorias ao comboio e, dou outro, como fariam o seu levantamento.
Ideias talvez bem intencionadas mas, básicamente, incapazes de solucionar um problema deste tipo.
O que ganharam, realmente, os transportadores com o “acordo” efectuado com o Governo?

1) Reconhecimento legal do direito a indexarem os seus preços de venda dos serviços, os aumentos dos combustíveis.
Esta medida é perfeitamente demagógica.

Tratando-se de um sector onde os preços não são regulados ou fixados administrativamente onde, em consequência, cada transportador cobra o que muito bem entender e o mercado esteja disposto a pagar.

O que acontece, e isso não há decreto-lei que os proteja, é que quem faz os preços é a concorrência e os clientes.

Já contratei na minha vida centenas de cargas completas ou parciais e sei do que falo.

Não entendo como podem os transportadores “embandeirar em arco” com esta demagógica medida que lhes não vai resolver ou ajudar em nada.

2) Reconhecimentos legal do direito a receberem no prazo de 30 dias.

Tal como acima também aqui é o mercado, entendendo-se aqui por mercado as relações cliente-fornecedor, que manda e também não entendo como se deitam foguetes por uma consagração que nada adianta ou resolve.

Para o lugar de um transportador que não queira aceitar o que o cliente lhe propõe haverá dezenas a quererem.

3) Majoração em 20% dos custos de combustíveis em sede de IRC.

Esta é uma medida com interesse efectivo mas repercussão somente após o fecho das contas do exercício na altura da liquidação de Imposto e, além disso, estará a comprometer a acção de futuros governos.

Acontece que a esmagadora maioria das empresas de camionagem, micro e médias, se confrontam com problemas graves de tesouraria e esta medida, efectivamente interessante, ao contrário das antecedentes, não ajuda em nada a ultrapassar essas dificuldades, tanto mais que somente quem se dedique ao longo curso poderá abastecer-se em Espanha ou noutros países Europeus onde os preços divergem significativamente dos que por cá se pagam:

Preço sem taxas na última semana
Portugal - 815,97 - Euros por 1.000 Litros
Média UE - 27 - 800,42
Desvio em relação à média UE: 15,55

Fonte: ANTRAM - http://www.antram.pt

4) Redução do valor das portagens durante o período nocturno.

Uma medida que beneficia as grandes frotas enquanto que as micro e pequenas empresas pouco benefício vão colher.

5) Manutenção da taxa de ISP nos próximos 3 Orçamentos de Estado.
Esta é uma medida que me parece com interesse mas que, também ela, só começará a fazer sentir os seus efeitos lá para o próximo ano, não ajudando a resolver os problemas imediatos de tesouraria.

6) Forma especial de pagamento do IVA com efeitos a partir do próximo ano fiscal.

De todas parece-me ser esta a medida que em mais curto espaço de tempo poderá trazer algum alívio á tesouraria das empresas/empresários.

A actual forma de liquidação do IVA, mensal ou trimestral, não leva em conta se o IVA liquidado nas facturas foi ou não cobrado efectivamente por quem o tem que pagar e implica um acrescido esforço na tesouraria de todos os empresários do País.

7) Subsídios a formação profissional fazem todo o sentido, mas fazem sentido para todos os sectores da economia, dado são medidas administrativas, derivadas da aplicação do Código de Trabalho e de Directivas CE, cujos são elevados.

A necessidade de proporcionar essa formação impende sobre todos os sectores de actividade e uma formação inicial certificada, para obtenção de um CAP e a formação contínua, são um sector onde manda a lei da selva com as empresas ou associações socioprofissionais a cobrarem o que muito bem entendem, e à qual, por esse motivo, um gigantesco universo de empresas não tem acesso.

Acresce que a formação profissional certificada, na maioria dos casos, especialmente quando não proporcionada por associações de classe, se limita a “cumprir calendário” ficando muito aquém dos objectivos que o Código do Trabalho pretende ver atingidos.

Ainda assim noto também com pasmo que despesas com educação, a formação é educação, sejam sujeitas a uma taxa de IVA de 21%.

Acho isso espantoso, mas a sede de receitas é imparável e incomensurável.

8) Apoios específicos para a renovação de frotas, e para o abate de veículos em fim devida, são medidas que não tive, nem tenho agora, tempo para estudar e, em consequência, não comento.

RESUMINDO:
a) A descompressão da tesouraria não se vai verificar;

b) Os transportadores continuarão sujeitos às leis do mercado, da oferta e da procura, e será ele e só ele, a determinar o preço dos fretes, os prazos de liquidação das facturas, etc. e o governo que se deixe de “atirar poeira” para os olhos dos cidadãos.

c) O micro, pequenas e, seguramente também, médias, empresas do ramo, com as margens cada vez mais esmagadas e cada vez maiores necessidades de tesouraria, fecharão, queira Deus que me engane, as portas a um ritmo cada vez mais acelerado.

Consequências de um liberalismo selvagem que o governo auxilia e encoraja a que seja cada vez mais exacerbado, onde as Petrolíferas e os especuladores conseguem por o mundo numa crise de consequências ainda imprevisíveis.

Tenho para mim que esta ordem social está esgotada e falida.

Saudações a todos(as)
A Nau Catrineta

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